sábado, setembro 14, 2013

ADAGA





Há nesta noite um mar de silencio que se abate sobre a alma,
como ave de rapina sobre a indefesa presa que descuida de si.
Há um punhal de realidade absurda e de incongruente calma
enterrado no mais profundo do meu ser, abrindo mesmo ali
no coração um lenho dorido, uma ferida jamais sarada,
jamais consertada, remendada. Jamais calada ou reparada.
Há nesta noite um raio de luar prateado que me transporta
para bem longe daqui. Para um lugar mágico e encantado
onde tudo para e paira , tudo flutua. Um lugar que comporta
o sonho, o desejo, o riso e a lágrima, o segredo mais guardado.
E há esta adaga que me acorda, me desperta de devaneios,
não me permite perder-me em sonhos, e me acorda sem rodeios
para a dura realidade - Este silencio rapace que devora esta alma,
que consome o coração, que obriga ao grito magoado e mudo
que na garganta veio morrer, como um pranto que se acalma
em lágrimas de intensa dor. Como um sacrílego tributo
a um moribundo amor

quinta-feira, agosto 29, 2013

É A HORA!


É hora de recolher as velas e deixar o barqueiro descansar,
é hora de esquecer a maré deixando o barco bolinar.
É hora de fechar os olhos, negros gastos de tanto procurar.
É hora de permitir ao corpo simplesmente relaxar.
É hora de chamar os deuses que imperam no grande mar
e com eles orquestrar uma nova sinfonia.
É hora de calar fundo toda esta horrenda agonia
em que mergulho de cabeça, sem sequer poder pensar.
É hora de querer e não querer, hora do sim ou do não,
é hora de ser o que sou, apenas e só mulher.
É hora de arrancar esta pele, e esta máscara se puder,
é hora de arrumar todo o medo, de pedir e dar perdão.
É hora de beber o cálice, seja de fel ou de absinto,
seja do mais puro e doce néctar ou seja de suavíssimo mel.
É hora, minha vida, é hora! é hora de percorrer cada aurora,
alcançar cada poente, dançar louca pela estrada fora
despojada de preconceitos, de normas e leis de papel.
É hora de abrir todas as portas dar largas ao que sinto.
 
 
É hora de recolher as velas e deixar a noite flutuar…..

sábado, agosto 10, 2013

PASSOU O MEU TEMPO.....DESVAIRADO


Como a asa de uma gaivota que perdeu o rumo,
como o fumo de um navio que passou ao largo.

Passou o meu tempo….
Como a gaveta aberta onde alinho e arrumo
as memórias que vogam num mar triste e amargo.

Passou o meu tempo…
Como o beijo aflorado, o desejo ancorado na praia deserta,
como a água que por entre os dedos se esvai incerta.

Passou o meu tempo….
Do tempo que não para nem se acerta, do tempo que sobra
do tempo que chora, do tempo que ri e soçobra.

Passou o meu tempo…
E ficou o espaço oco e enevoado, como manhã de outono,
como barco fantasma, como lágrima cristalizada em puro abandono.

Passou o meu tempo…
Nas mãos abertas vazias, nos olhos fechados em sonhos perdidos,
no corpo usado e despido, em todos os despertos sentidos.

Passou o meu tempo….
Na espera de um novo tempo, sentado à beira do abismo,
oscilando entre o cá e o lá, entre a luz e a escuridão, perfeito antagonismo!

Passou o meu tempo…
Nas palavras murmuradas, nas juras apenas sonhadas e nas que foram juradas
entre o soluço e o grito de solidão. Nas frases de paixão apenas sussurradas.

Passou o meu tempo…
Na ilusão de um momento, efémero, precioso, vivido e ambicionado,
mas o tempo apenas passou sem se ater a nada. Passou desvairado!


 

quinta-feira, julho 04, 2013

LUA CHEIA



Uma lua prateada projecta-se na noite escura como breu
As sombras, são anjos negros alados de doirado sonho,
e as memórias flutuam soltas, libertas sem fronteira e sem margem.
A lua lança no meu leito vazio um poder inebriante que é seu,
tão seu! Tão único, tão dolorosamente belo e medonho.
E pela janela entreaberta o perfume da terra mistura-se na aragem.
Uma enorme lua prateada cobre o meu corpo de orvalho luminoso,
beija a minha alma com o ardor da solidão, num desejo majestoso
de ser fogo, e ar e água, de ser o tudo e o nada, o hoje e o amanhã.

 
Ah longínqua lua prateada cobre toda a mágoa gritante, esconde-me ate ser manhã.





segunda-feira, junho 17, 2013

O SOM DO SILENCIO

Acordei ao som do silencio, num quarto vazio de vida,
vazio de mim.
Acordei pela mão enganosamente doce da ausência dividida,
do caminho do fim.
Hoje a madrugada foi mais negra e a aurora mais dura.
Hoje acordei sem acordar.
A manhã entrou pelo quarto com um sopro de secura,
como um vento glaciar.
Acordei ao som do silencio, do vazio a ressoar
a escorrer pelas paredes de um quarto oco a vibrar.

Hoje vesti-me de esquecimento e elevei-me no ar,
e deixei que o mistral me levasse.
Hoje olhei sem ver esta vida, passando só por passar,
e deixei que o mar me molhasse.
Pedi ao tempo que abrandasse o seu eterno correr
para me deixar respirar.
Pedi à minh'alma forças para acreditar e querer
continuar a caminhar.
Mas apenas o silencio me responde, profundo a magoar.
Pesadamente marcando cada passo do meu andar.

quinta-feira, maio 30, 2013

SUPENSO SEGUNDO



Deixa-me apenas viver o segundo em que respiro,
nada mais que este suspenso segundo em que nada importa,
nem o riso, nem a lágrima, nem o sol nem a lua.
Deixa-me apenas absorver a vida neste suspiro,
neste brevíssima nota que nada mais comporta;
Nem sonhos, nem desejos, nem sensatez nem loucura.
Deixa-me apenas vogar, intemporal, neste segundo,
neste limbo perdido entre o cá e o lá,
entre o querer e o não querer, amar e desesperar.
Deixa  o meu arroxeado olhar desvanecer-se no mundo
que de braços abertos me aguarda em hora boa ou má.
Deixa-me apenas ser um suavíssimo respirar,
sem tempo, sem rumo, sem norma ou finalidade.
Deixa-me somente afundar na dura realidade
que é este breve segundo do meu respirar.....

sexta-feira, maio 17, 2013

VOGANDO




Vogo na fímbria sombria de um sonho acordado,
resvalando mansamente para um abismo que desconheço
e não temo.
Vogo como folha perdida em vendaval encarniçado,
como alva espuma em maré viva onde envelheço
mas não tremo.
Deslizo sem ruído pelas dobras desta vida,
ora vou, ora venho...Ora estou, ora fui,
olho sem ver, sonho se sonhar, quero sem querer.
Desejo sem desejar, acredito sem acreditar no amanhecer.
Empurrada, puxada, repartida e dividida,
passo a passo trilho o caminho que se dilui.
Deslizo na imensidão dos pálidos dias sem rumo,
como desfolhada margarida em agreste invernia,
como encanecido carvalho que perdeu o prumo
e se vergou silencioso à gelada ventania....

O TEMPO PERDIDO NÃO SE RECUPERA

As palavras lançadas não voltam atrás, o tempo perdido já não tem retorno e a vida esvai-se, no silêncio voraz. Fica o caminho, diluído, sem...