segunda-feira, junho 25, 2007

TERRA VIBRANTE - I

O vento cortante do sopro marítimo atingia em cheio a pequena vila encolhida nas brumas salgadas. As pedras desgastadas pelas intempéries e pelo rodar dos anos do porto, eram lambidas furiosamente pelas águas revoltas, escachoantes e repletas de alvas espumas que no ar se elevavam qual poalha translúcida e fria que ao nevoeiro breve se juntavam. Os barquitos, a salvo bem no topo do molhe, mais pareciam velhos lobos-do-mar olhando saudosos as profundas águas seu elemento natural. A quietude era apenas cortada pelo forte embate do mar, agressivo e duro nas pedras, no paredão e nas escadas que lhe travavam os ímpetos. Não se via vivalma nas ruas da vila, as portas e portadas permaneciam obstinadamente fechadas, as redes de pesca e os apetrechos cuidadosamente arrumados nos seu lugares à espera de nova onda benigna que os levasse até aos tesouros do azul profundo. As aves haviam calado os seus trinados, até os cães vadios pareciam ter-se encolhido nalgum canto escuso. O silêncio sepulcral da vila levava a crer que, por misteriosa mão, tudo se evaporara deixando os esqueletos das vidas que normalmente por ali giravam, nas suas azáfamas diárias, nos seus afazeres costumeiros. Onde estavam todos? Não que os houvesse muitos é uma verdade, mas mesmo assim entre os pescadores, o pessoal do balneário, e todos os que do comércio viviam ainda faziam jus a uma Câmara Municipal e quatro juntas de freguesia…Onde estava uma vila inteira? O “monte” não fumava, as terras haviam algum tempo não fremiam sob os pés dos homens, que se soubesse ninguém havia passado para os braços do Criador, então, onde estavam?Lá bem no interior da ilha a azáfama era totalmente diferente; Do continente tinham chegado havia alguns dias dois vulcanólogos, um fotógrafo e dois espeleólogos que se iam dedicar ao estudo da cratera ainda activa. Esta estava num local quase paradisíaco, envolta pelo manto verdejante que caracteriza estas paragens de contos de fadas, descoberta alguns séculos atrás, por acaso, no decorrer de uma batida pelos bosques e montes, a imensa bocarra estava agora airosamente complementada por uma torre que lhe dava acesso mais fácil que não a anterior arriscada descida por cordas lançadas pelos buracos a mais de 300m do solo da gruta escorregadia e traiçoeira. Pelos trezentos e muitos degraus tinham sido descarregados, afanosa e penosamente os materiais dos cientistas que dir-se-ia tinham trazido a casa às costas tal era a quantidade de aparelhos, que espalhados por todos os cantos da gruta jaziam. Cá no alto, numa minúscula sala de controlo, os vapores emanados pelo vulcão eram controlados milimétricamente e, consoante as épocas do ano, assim se permitiam as visitas, as descidas e as prospecções, já que não raro era a atmosfera de gruta ficar te tal forma saturada das emanações de enxofre que a asfixia era mortal em poucos minutos. Após alguns sustos em tempos passados havia sido instalado o antiquado, mas eficaz, dispositivo de detecção de gás para salvaguarda dos que lá a baixo se atreviam a descer, conhecer e estudar, ou até, rezava a sabedoria popular, tratar alguns “males de pele e respirações dificultosas”.Do grupo somente dois conheciam o local, para os outros a gruta era o imenso desconhecido. A luz difusa que pelo “tecto” entrava, o ambiente rochoso, escuro de erupções anteriores, o cheiro característico a enxofre que da poça borbulhante se elevava, as pequenas formações no solo, eriçadas de amarelo e quentes ao tacto, e a maravilha que a todos encantava; O lago! Esse lago que de tão traiçoeiro era um mistério quase insondável.Parecia ter marés pois o nível das águas ora subia ora descia, ora quase inundava a gruta deixando pouco espaço para nela se andar, ora quase desaparecia nas profundezas apertadas e negras da garganta que se estreitava qual funil lá no fundo. De águas quentes e sulfurosas, nas quais um mergulho era totalmente desaconselhado, não obstante a presença continua de um barquito na margem, que, a força braçal, levava os mais destemidos até ao estreito por onde as águas se escoavam, sabe Deus ou o demónio para onde.De momento o lago está em maré vazia, a emanação de gás estável e os nossos homens e mulheres desenvolvem o seu trabalho com satisfação e calma, entre graçolas e piropos, entre medições, fotografias, recolha de amostras e perfurações no solo rochoso.

1 comentário:

Anónimo disse...

Minha querida amiga, não vou tecer ainda qualquer comentário ao teu conto, porque vou lê-lo com atenção, mas tenho a certeza que estará lindo como de costume. Agora deixo-te só um grande eijo de amizade sincera.

O TEMPO PERDIDO NÃO SE RECUPERA

As palavras lançadas não voltam atrás, o tempo perdido já não tem retorno e a vida esvai-se, no silêncio voraz. Fica o caminho, diluído, sem...