quinta-feira, janeiro 15, 2015

ILUSÓRIA NORMALIDADE..

Acordou no escuro do quarto silencioso e calmo, apenas a respiração pausada de anciã se ouvia. Lá fora o sol já brilhava alto no céu azul. Mas isso não importava, pouco sentido fazia. Ali deitada no ambiente morno e aconchegante onde o medo e o desconforto não entravam, estava sossegada, quase feliz. Mas essa sensação não iria durar muito mais. Não que ela soubesse de antemão o que se ia passar, isso não acontecia há alguns anos. Por agora limitava-se a ficar numa espécie de limbo, entre a semi inconsciência e uns laivos da realidade que a rodeava.
Dentro em breve o drama iria começar; Ter que se levantar, ter que se mexer, lavar, vestir, comer… O que lhe passava na ideia, ninguém sabia, apenas quem estava de fora recebia as reacções mais ou menos bruscas, mais ou menos duras e irritadas. O fosso entre a realidade e o que era a “sua” realidade crescia cada vez mais. Porque tinha que se levantar se estava a dormir tão bem sem trazer problemas a ninguém? Porque tinha que se lavar e vestir? Mas porque não a deixavam ficar quieta, calada e sossegada? E pronto lá começava a guerra, a fúria incontida e descarregada sem qualquer controle. Se as situações que aconteciam eram contra o que queria, reagia com agressividade. E ficava por perceber se era o medo, se era o desconforto que as despoletava. Ultrapassada a primeira guerra, que tantas e tantas vezes passava por deixa-la sozinha na casa de banho por alguns minutos, vinha a segunda e talvez mais dura e difícil guerra; comer. Enquanto a sua cabeça não a atraiçoara não fora uma pessoa de comer muito, aliás nunca se lhe ouvira a frase; “tenho fome”! E agora que os circuitos cerebrais estavam mais débeis, todo e qualquer tipo de alimento era sempre saudado com um; “Não quero, não tenho fome”, desespero de quem tinha que tratar e prover ao seu bem-estar e vida. Havia muito que a mastigação e a deglutição tinham perdido a coordenação. Se mastigava não engolia, e para engolir não podia ter nada que mastigar, bastava encontrar um pedacinho de algo sólido na comida passada para ser posto na borda do prato. Mas se se lhe apresentava comida passada era outro desespero, queria comida como os outros e era impressionante como não tinha a noção das suas limitações. 
Que mistérios encerra o cérebro humano!


Por agora reina a calma e depois do stress de levantar e comer algo, a “normalidade” está estampada no rosto. Mesmo sendo uma ilusão, parece que o tempo voltou para trás e os anos e a doença se apagaram. A mansidão no tom de voz, os gestos coordenados e certos, a conversa com tino, coerente e pouco repetitiva. Uma paz ilusória mas tão boa invade o ambiente da sala… O sol da rua inunda estes momentos e empresta-lhes uma beleza que quase parece eterna, quase parece normal. Mas o sorriso já denuncia o alheamento, e paira no rosto sem expressão, a neblina do esquecimento instalou-se de novo…
Foi como que um raio de sol que surgiu num dia de temporal e que as nuvens carregadas esconderam rapidamente.


terça-feira, janeiro 13, 2015

METAMORFOSE DE MIM

Vou despir-me de querer estar e ser o que não faz falta.
Vou encostar-me no meu espaço e calar o que não interessa.
Vou caminhar mansamente,vou esquecer-me como se salta
para a vida de quem não nos quer. Sigo silenciosa e imersa
nas águas escuras do esquecimento.
Vou deixar-me nas marés desta vida sem me debater,
vou ser uma folha no vento,  uma borboleta sem cor,
vou sem me revoltar, sem lutar, sem querer de nada saber.
vou ser uma monocromática paleta de um qualquer pintor,
uma pincelada rasgada sem era ou tempo.
Vou-me despir de quem sou, metamorfose de mulher,
vou ser tudo o que não foi nem sou, e será que o sei ser?
Vou vestir-me deste ano em 365 sonhos por colher,
por semear,  por regar, sachar, adubar e ver crescer.
Vou apenas deixar-me embalar nas ondas de um novo vento.



sexta-feira, janeiro 09, 2015

DE MIM PARA TI....

Oiço a voz do silencio do teu abraço,
um silêncio que preenche no calor dos braços,
na certeza da presença que é o traço
de uma vida que cresceu dos estilhaços,
que tantas vezes assaltaram o caminho.
Este caminho tocado a quatro mãos com carinho.

Oiço a voz do silêncio do teu sorriso,
na gargalhada liberta e solta sem barreiras,
nas loucuras das horas passadas e no riso
controlado, ou nas lágrimas sofridas e verdadeiras.
Vida que cresce a par e passo, empenhadamente,
suada, esforçada, caída e levantada corajosamente.

Oiço a voz do silêncio em ti e em mim no bater uníssono do coração.


O TEMPO PERDIDO NÃO SE RECUPERA

As palavras lançadas não voltam atrás, o tempo perdido já não tem retorno e a vida esvai-se, no silêncio voraz. Fica o caminho, diluído, sem...