...Ela mostra-lhe a filosofia dos povos, a “alma” que se solta das vivências, ele mostra-lhe a geografia, a história, a humanidade, a realidade que conhece tão bem, e ambos fazem daquelas paragens o seu lar. Integram-se cada vez mais na mentalidade, sem contudo esquecerem as suas origens, sem contudo esquecerem o seu propósito e a missão que o governo do seu país lhes deu, mas o conhecimento aprofundado daquela terra ajudam-nos a cumprir muito melhor o seu trabalho e fazer benfeitorias inigualáveis. Inês inebria-se com as cores quentes de África, perde-se destemida nos mercados, que aprendeu a conhecer, deleita-se na mistura exótica dos aromas fortes das especiarias; Açafrão, Noz-moscada, Gengibre, Pimentas, ervas aromáticas que maneja como qualquer dona de casa africana, ao mesmo tempo que eleva a alma ao ritmo da filosofa asiática. Os artefactos de ambas as culturas co-habitam harmoniosamente no seu apartamento, e só lamenta não ter uma das mansões enormes dos sultões, ou dos emires, para poder dispor de espaço para tudo o que a cativa e quer ter ao seu lado. A biblioteca de Filipe é outro manancial e nos primeiros tempos sempre que lhe era permitido pelo trabalho, esquecia-se das horas naquele espaço calmo e sóbrio, onde colheu ensinamentos preciosos, bases para a sua vida por aquelas paragens. Aprendeu a flora e a fauna, aprendeu culinária, iniciou-se na língua e passou à escola para falar um árabe e um hindi fluentes, já que línguas eram o seu ponto forte, aprendeu história e geografia, embrenhou-se nas religiões e estudou os costumes, as filosofias que a fascinavam e lhe davam perspectivas que jamais conhecera ou se atrevera a desenvolver. Era Filipe quem muitas vezes a ia lembrar que no dia seguinte tinham que se levantar cedíssimo para o trabalho que os esperava, e era sempre com uma expressão de amuo ligeiro que arrumava os livros de novo nas prateleiras. Ao que ele rindo lhe dizia que os livros deviam de noite fazer um baile porque em anos nunca ninguém os consumira tanto como agora. O rosto alegre e atento da rapariga era cada vez mais insinuante na vida de Filipe, a presença e o trabalho de Joana desenvolviam-se a um ritmo certo que deixava o embaixador descansado e confiante nas capacidades por ela demonstradas. Viam-se resultados concretos das suas acções e empreendimentos graças ao trabalho e empenho de ambos, e ela mostrava uma faceta peculiar e inata que lhe emprestavam a graça que o tinha encantado no aniversário da afilhada. Muitas vezes ia espreita-la sem ruído só para lhe captar a expressão compenetrada e atenta, ou ouvir a gargalhada típica se era apanhado em flagrante.
Passaram-se os anos, e do pequeno apartamento restavam os artefactos habilmente recolocados no casarão que entretanto haviam comprado, as horas de biblioteca eram agora a dois, e os escritórios eram apenas um, tal como o empenho, amor, e apego aquelas paragens que haviam unido dois corações num só. África e Ásia, Joana e Filipe."
Passaram-se os anos, e do pequeno apartamento restavam os artefactos habilmente recolocados no casarão que entretanto haviam comprado, as horas de biblioteca eram agora a dois, e os escritórios eram apenas um, tal como o empenho, amor, e apego aquelas paragens que haviam unido dois corações num só. África e Ásia, Joana e Filipe."
O olhar perdido num horizonte distante, nas terras vermelhas que tanto amou, no exotismo em que foi feliz, mulher e mãe. A mão que prende na sua traz-lhe as recordações dessa outra mão que há muito tempo trás envolvia a sua e lhe dava a certeza de que tinha escolhido o caminho certo. Avó Joana deixa que uma lágrima cristalina, qual gota de orvalho, se prenda delicadamente nas pestanas ainda compridas e fartas que, docemente, descaem sobre os olhos.
FIM
FIM