domingo, maio 27, 2007

JANELA ABERTA


Na penumbra do quarto, de olhar perdido pela janela entreaberta, a cabeça repousando na almofada alva e macia, os cabelos anelados e revoltos espalhados em todas as direcções, os lábios num breve sorriso amargo e as mãos, esguias e brancas, cruzadas sobre o peito que docemente oscila a cada inspiração. Do exterior, o som quente das cigarras e dos trinados alegres da passarada em redor lembram uma primavera alta e já bem quente, as cortinas diáfanas ondulam à aragem morna, mas nada perturba aquele corpo, inerte sobre o leito. Dir-se-ia morta, ou agonizante, tal era a quietude, só os olhos, os olhos aveludados, escuros e doces vibravam num turbilhão de sentimentos.
Havia poucas horas a sua vida fora destruída por uma avalanche devastadora;
O único amor que alguma vez tivera, acabava de sair da sua vida.
Suportara heroicamente a notícia, nem uma só lágrima aflorara aos seus olhos, mas no seu peito, o coração cessara de bater, um buraco imenso e negro abrira-se e engolira-a, inteira, de uma só vez. Foi como se uma lâmpada de 100w tivesse rebentado provocando um clarão e, subitamente, o negrume hiante e louco da solidão, foi como se tivesse levado um soco forte no estômago e sobre si mesma se dobrasse sem ver nada com a intensidade da dor, foi como se um oceano de mágoa sobre ela se abatesse impedindo-a de respirar. Caminhara até casa sem saber por onde fora, que ruas tomara apenas sabia que tinha que encontrar algo seu, algo onde se pudesse esconder, afastar-se do mundo e dar largas à dor insuportável que a arrasava. E ali estava agora, deitada, incapaz de pensar, incapaz de sentir, amorfa, sem rumo, sem vida, sem nada. Vazia!
O que buscara no sossego do lar não encontrara, somente o vazio e o silêncio, a paz não a tocara, e o vazio, esse imenso e doloroso vazio a preenchiam, a quebravam e venciam, lhe tolhiam os pensamentos, amordaçavam a alma e esgotavam as forças. Pelo olhar passava o fogo de um amor trocado sem restrições, de uma partilha integral, de uma comunhão sem limites, passava a sombra da dúvida, do desalento, do desespero, do abandono, passava o ódio e o amor, amalgamados num só, indistintos; Tão depressa se sentia traída e usada, como querida e amada ao extremo, tão depressa se sentia desejada, possuída, conquistada e rendida, como despojada, esgotada, sem valor, sem préstimo. A sua alma oscilava perigosamente à beira do abismo da loucura e do desespero; Porquê? Porquê depois de tanta luta, tanto esgrimir com a vida, tanto batalhar, porquê agora? E a resposta era uma só; Porque assim tinha que acontecer, tudo nesta vida tem princípio, meio e fim e a sua relação atingira o último estádio – O fim. Até à tão pouco tempo as doces palavras sussurradas ao ouvido, as carícias trocadas na mesma penumbra que agora a envolvia, o som calmo da música preferida, o riso cristalino dos corpos arrepiados de prazer, e a voz branda e calma, envolvente e doce a seu lado. Agora só a sua voz interior se fazia ouvir, perdida, esgotada, lutando contra a escuridão que a envolvia cada vez mais densa, mais forte, mais dura, mais aguerrida.
Numa explosão de dor, o seu corpo cede; As lágrimas finalmente soltas e loucas, caem dos olhos como rios a que a invernia fez aumentar o volume, os soluços sacodem-na desesperadamente, e no ar morno o som de uma voz dorida e só faz-se ouvir, como o lamento de um animal em agonia, toda a dor, toda a amargura rebentam incontidas devastando tudo à sua passagem.
A noite caiu, o silêncio lá fora contrasta com o som magoado do soluçar no quarto, onde a janela permanece entreaberta deixando que o fresco da noite entre e tente abrandar o braseiro de tristeza que sobre a cama jaz em espasmos incontidos daquele corpo tão abandonado. Um raio de luar prateado entra e pousa de manso no rosto orvalhado de lágrimas, como que a beija-lo e a acaricia-lo.
O telefone toca estridente e agudo na solidão das quatro paredes, mas a sua mão não se estende, como outrora, rápida e feliz para o atender, o toque esmorece e acaba numa mensagem do gravador de chamadas;
“ Amor, se ainda te posso chamar assim, peço-te perdão, não consigo viver sem ti”.

quinta-feira, maio 24, 2007

MANSOS PASSOS


Pé ante pé de mansinho

o sonho abre alas,empurra a bruma,

espraia o tempo devagarinho.

O ar, mais leve que uma pluma,

eleva-se rosado em céu cinzento,

e o sonho teima em caminhar

em seu tom neutro, pardacento,

incapaz de se calar

porque o sonho grita mais alto,

porque a alma não se cala,

porque o coração em sobressalto

se agita, se torçe e resvala

para a névoa da memória

essa tão imensa história

que nos põe de novo no rumo,

nos faz de novo viver,

ter orgulho, ter aprumo,

desejar, amar e querer.

Pé ante de pé, devagarinho,

o sonho vem deitar-se a meu lado

beijando, calmo de mansinho,

este severo e triste fado

que é amar de longe e calado.

sábado, maio 19, 2007

SOLUÇO D'ALMA



Sentei-me à beira do caminho e escutei o silêncio que me sussurra a tua voz. Escutei a folhagem que rumoreja lá no alto e me faz sentir pequena, perdida casquinha de noz. Duas lágrimas, quais pérolas doridas, rolam caladas, descem mansas,
descoloridas, pelas faces já cansadas. No peito o coração já se calou ao estoque das punhaladas. Perdida do amor me encontrei, perdida do sonho caminho, e todos os passos que dei foram aves sem rumo nem ninho.
Sentei-me à beira do caminho e chorei, solucei perdidamente, a noite desceu e mansa me envolveu em seu manto, cobrindo-me friamente. As pedras rasgaram as trevas e os seu brados lamberam a cercania, o ribeiro chorou pelas fragas e nos cabeços uivou a dura ventania.
Sentei-me à beira do caminho pontilhado a azul e rosa, encabeçado de verde, vestido de fantasia.
Sentei-me à beira do caminho e soçobrei na ironia.

terça-feira, maio 15, 2007

EXCLUIDA


Folha arrancada de um livro que o tempo se encarregou de amarelecer, pedaço de vida sem gosto, sem cor, nos dias que se esquecem de amanhecer.
Folha amachucada, perdida, enrugada, pisada, rasgada sem préstimo algum, já rabiscada, suja e amarfanhada, que o vento arrasta para lugar nenhum.
Eterna excluída, banida e esquecida depois de usada, depois de rendida, como qualquer folha de um velho caderno largado a um canto sem sinais de vida.
Vogo em mares de negras vagas, alterosas ondas de medos sem fim, vogo sem rumo entre escolhos mil, à espera de mim. Tempestade imensa, insana tormenta! Que arrastas louca uma frágil noz, que tudo arrebatas e nada te contenta, nada te seduz, nada te demove, devoras enraivecida cada estrela ardente, tempestade em chamas, que tudo arrasas e docemente queimas esta folha dolente…
Folha arrancada de um livro qualquer que o tempo comeu, que o tempo gastou, que o tempo esgotou que o tempo esqueceu.

sábado, maio 12, 2007

OLÁ AMOR!




Olá amor,mais uma vez
e outra e outra ainda,
infinitas vezes, talvez,
aguardando a tua vinda.
Nada chega para este amor
assim, grande, forte, incontido,
nada cala este clamor
sentimento repartido.
Olá amor, nesta loucura,
neste querer-te mais que tudo,
na solidão mais escura
sentir profundo e mudo.
Nada mais quero que amar-te
poder ter-te, tocar-te, prender-te,
cobrir o teu corpo de beijos,
acolher-te em mil desejos...
Olá amor, mais uma vez,
e outra e mais outra, infinitas!
Perco-me em tantos, porquês,
malhas de duras desditas.
Olá meu amor, mais uma vez....

terça-feira, maio 08, 2007

SOMBRAS


Do passado elevam-se negras as sombras.

Como gigantes de tenebrosas faces

que se arrastam medonhos pelas alfombras

em breves e estreitos enlaces.

Do passado mais profundo, elevam-se em riste

as memórias mais pungentes, mais loucas,

e as promessas mais doces, o amor mais triste.

E nós ficamos, sós, perdidos, unidas as bocas

num beijo eterno sem cor, nem tempo,

perdido na mágoa, na dor do desalento!

Perdido do mundo, afastado de nós,

acrisolado no espaço desta vida desfeita,

deste resto que arrastamos, doendo, a sós.

Pedaço de sonho, quimera imperfeita

que do passado se eleva, qual sombra atróz,

selada num beijo eterno e sem voz.

sábado, maio 05, 2007

IMENSIDÃO DO VAZIO

Na imensidão da noite sem fim

onde os ecos do passado soam alto,

onde a escuridão envolve as sobras de mim
lançando-me no vazio ao assalto

da minha alma fria e oca.

Coisa pequena e tão louca!

Nesta noite tenebrosa e vazia,

onde o murmurio do vento

e o leve perfume a maresia,

nada mais são que um lamento

da minha alma louca e vazia,

coisa tão pequena e fria!

Perdida em mais uma noite

de tenebrosa agonia.


sexta-feira, maio 04, 2007

AWARD



A querida Juli e o Gui, tiveram a gentileza de atribuirem o "Thinking Blogger Award" a este espacinho que dá pelo nome de "Lagrimas de Luar", agradeço aos dois a delicadeza e a ternura, porque este espaço não merece de todo um tal prémio.
No entanto é bom saber que gostam de o visitar e que de alguma forma "faço pensar".
OBRIGADA
E como tenho que nomear passo à fase das dores de barriga;

"Eternidade num Momento" - Vlad
"Em Conto" - Também de Vlad
"O Alquimista"
"Pensamentos da Alma" - Igara e CIA
"Ana Luar" - Ana
"Tulipa Negra" - Gui
"Coisas do Gui" - Também do Gui
"Sintra - A Glorious Eden" - Igualmente do Gui
"Flores Elsfos e Anjos" - Sindarin
"Lagrimas e Sorrisos" - Juli
Um beijo grande para todos

O TEMPO PERDIDO NÃO SE RECUPERA

As palavras lançadas não voltam atrás, o tempo perdido já não tem retorno e a vida esvai-se, no silêncio voraz. Fica o caminho, diluído, sem...