O vento fustigava em ondas de raiva a vegetação ressequida da orla costeira, a ventania salgada e forte vergava duramente os caules dando a impressão, a quem via, de um mar verde em convulsões ou espasmos de maternidade. Era sempre assim a chegada de mais um Inverno, as neblinas glaucas envolviam a costa no seu manto de arrepiante e sepulcral silêncio, as aves aconchegavam-se nos ninhos tufando as penas e tentando conservar o calor dos corpos juntando-se mais às companheiras com quem partilhavam o espaço, e, se nova geração ainda havia, a mesma era coberta pelos corpos enregelados dos pais.
As águas rugiam tocadas pelo sopro duro de Eolo que no seu búzio os quatro ventos chamava a plenos pulmões. O fundo marítimo revolvia-se como se milhares de mãos o agitassem sem descanso e o empurrassem para cima, trazendo à tona areia, sedimentos, lixo e a ira do próprio mar, as ondas atiravam os seus corpos de alva espuma de encontro aos rochedos, ás fragas e ás areias frias e solitárias.
No alto da falésia uma figura alta, descarnada e firmemente cravada no solo olhava, alucinada o bravio oceano, concentrando em si aquela força inóspita e bruta, como que sugando a energia das águas em rebelião. Os cabelos de neve agitavam-se ao vendaval, a mão, seca, e engelhada de muitos e duros trabalhos segurava firmemente o bastão tão nodoso como os anos de ancião, a longa barba tão branca como as cãs esvoaçava como algodão, adoçando o rosto tisnado e os traços duros e magoados, só os olhos conservavam a meiguice do olhar de criança; Azuis como miosótis, ainda frescos e vivazes, quase alegres, traziam áquele rosto fechado e ainda vigoroso um toque de doçura, um leve traço de mansidão e paz. A seus pés o mar, esse traiçoeiro e encantador mar, contorcia-se, rugia, debatia-se qual fera enjaulada e prestes a rebentar com as grades da clausura, mediariam forças um e outro? O estrondo das águas aumentava e a força da ventania também, lá bem no alto o velho homem do mar enfrentava sem se mexer a fúria do ar, o seu envelhecido corpo sustentava com um insuspeito vigor o embate e fazia gala em, de cabeça erguida, olhos pregados no infinito e pés bem assentes no lajedo, desafiar a natureza.
Quantas vezes ali estivera, no mesmo lugar, segurando nos braços o corpo amado, sussurrando as palavras mais doces, as juras mais sinceras, o amor mais belo, quantas vezes ali estivera rindo dos primeiros passos do fruto desse amor, ensinando, de costas nas rochas, os nomes de todas as estrelas, segurando a pequenina mão entre as suas matando o medo das noites de trovoada, e, em dias assim, saudando o Inverno, esse dono dos vendavais, mais temido que amado, mas que ele ensinara a respeitar e a amar. Mais tarde, ali viera chorar calado o amor cedo arrebatado dos seus braços e que aquele mesmo mar levara para bem longe de si, mas mesmo assim o encanto das estrelas nas noites calmosas de estio e o filho ainda novo por criar davam-lhe forças para continuar. E um dia, esse belíssimo mar, essa águas que tanto amava roubaram-lhe de vez a vida tragando, num dia como este, o único bem que lhe restava, o fruto amado e querido de um amor sem fim, o filho único.
Desde então vinha a cada chegada do Inverno que passara a odiar profundamente, desafiar a tempestade, medir forças com a natureza, orgulhosamente só, duramente fustigado pelo vendaval, decididamente cravado no solo inóspito, mergulhava o olhar ora desvairado ora meigo, ora magoado ora apaixonado naquele abismo de espuma. E a sua longa barba alva era como que um lenço acenando no alto da fraga ao amor da sua vida.
As águas rugiam tocadas pelo sopro duro de Eolo que no seu búzio os quatro ventos chamava a plenos pulmões. O fundo marítimo revolvia-se como se milhares de mãos o agitassem sem descanso e o empurrassem para cima, trazendo à tona areia, sedimentos, lixo e a ira do próprio mar, as ondas atiravam os seus corpos de alva espuma de encontro aos rochedos, ás fragas e ás areias frias e solitárias.
No alto da falésia uma figura alta, descarnada e firmemente cravada no solo olhava, alucinada o bravio oceano, concentrando em si aquela força inóspita e bruta, como que sugando a energia das águas em rebelião. Os cabelos de neve agitavam-se ao vendaval, a mão, seca, e engelhada de muitos e duros trabalhos segurava firmemente o bastão tão nodoso como os anos de ancião, a longa barba tão branca como as cãs esvoaçava como algodão, adoçando o rosto tisnado e os traços duros e magoados, só os olhos conservavam a meiguice do olhar de criança; Azuis como miosótis, ainda frescos e vivazes, quase alegres, traziam áquele rosto fechado e ainda vigoroso um toque de doçura, um leve traço de mansidão e paz. A seus pés o mar, esse traiçoeiro e encantador mar, contorcia-se, rugia, debatia-se qual fera enjaulada e prestes a rebentar com as grades da clausura, mediariam forças um e outro? O estrondo das águas aumentava e a força da ventania também, lá bem no alto o velho homem do mar enfrentava sem se mexer a fúria do ar, o seu envelhecido corpo sustentava com um insuspeito vigor o embate e fazia gala em, de cabeça erguida, olhos pregados no infinito e pés bem assentes no lajedo, desafiar a natureza.
Quantas vezes ali estivera, no mesmo lugar, segurando nos braços o corpo amado, sussurrando as palavras mais doces, as juras mais sinceras, o amor mais belo, quantas vezes ali estivera rindo dos primeiros passos do fruto desse amor, ensinando, de costas nas rochas, os nomes de todas as estrelas, segurando a pequenina mão entre as suas matando o medo das noites de trovoada, e, em dias assim, saudando o Inverno, esse dono dos vendavais, mais temido que amado, mas que ele ensinara a respeitar e a amar. Mais tarde, ali viera chorar calado o amor cedo arrebatado dos seus braços e que aquele mesmo mar levara para bem longe de si, mas mesmo assim o encanto das estrelas nas noites calmosas de estio e o filho ainda novo por criar davam-lhe forças para continuar. E um dia, esse belíssimo mar, essa águas que tanto amava roubaram-lhe de vez a vida tragando, num dia como este, o único bem que lhe restava, o fruto amado e querido de um amor sem fim, o filho único.
Desde então vinha a cada chegada do Inverno que passara a odiar profundamente, desafiar a tempestade, medir forças com a natureza, orgulhosamente só, duramente fustigado pelo vendaval, decididamente cravado no solo inóspito, mergulhava o olhar ora desvairado ora meigo, ora magoado ora apaixonado naquele abismo de espuma. E a sua longa barba alva era como que um lenço acenando no alto da fraga ao amor da sua vida.
2 comentários:
Minha querida amiga, é sempre encatador ler-te. Esta história é muito bonita e escrita com aquele encanto que só tu és capaz de por nos teus escritos. Um beijo grande, e venha outra história.
Hoje vou levar as tuas palavras comigo, deito-me naquele lugar onde recupero forças e no silêncio leio-te.
Beijo Nocturno
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