domingo, dezembro 19, 2010

PARA QUE SEJA - O NATAL


Mais um Natal à porta,

mais uma quadra de festa e luz, de cheiros, de sabores, de calor humano, de partilha. Dizem...

Mais um Natal à porta,

mais uma correria tirando toda a beleza da quadra, apagando o sentido verdadeiro. Fazem!

Mais um Natal que chega,

esperando que percebamos o seu sentido mais puro, o seu ÚNICO sentido. Esquecem...

Mais um Natal que chega,

simples, sem artifícios, sem ostentações. Apelando à comunhão e união, à concórdia. Ignoram!

Mais um Natal para viver,

sem a azáfama tresloucada e vã de quem não olha para o NATAL.

Mais um Natal para perceber,

na simplicidade e cumplicidade do dar e receber, não o presente mais caro, não a refeição mais copiosa, não. Um Natal para dar e receber o que de mais precioso existe e o dinheiro não pode comprar;

AMOR, ENTREGA, PAZ, SILENCIO, COMUNHÃO.

Para que deixe de ser apenas : - Mais um Natal que está à porta.

domingo, dezembro 12, 2010

OBJECTO, NADA MAIS


Como os lençóis que se mudam

ao fim de neles dormir,

como as flores que murcham

e as que nem chegam a florir.

Como as águas que rápidas correm

por baixo de tantas pontes,

e como as roupas que se escolhem

agora, para depois serem montes

de trapos sem préstimo ou uso.

Como a roca de cada fuso

e a trama de cada tear,

como o carro que se afina

para que continue a andar.

Ou como a calada máquina

cuja manutenção há que acautelar.

Como a folha onde se escreve

uma nota solta para memorizar.

Ou como a lembrança breve

de um tempo que passou.

Como a imagem que se apagou

do negro quadro de ardósia.

É o preço que se paga,

porque...Tudo tem um preço

sexta-feira, novembro 26, 2010

PENDULO


Balanço, balanceando na corda da ilusão,

balanço, menina louca, nesta imensa indecisão.

Balança criança adulta, na esperança de uma certeza,

balança mulher ingénua, lutando na aspereza

do caminho que traçaste.

Balanço, balanceando na certeza do pouco espaço,

balanço cambaleando, no tempo que é sempre escasso.

Balança, balança sem fim, dolente e sem pensar,

balança no rodopio do espaço por conquistar.

Tropeça naquilo porque lutaste.

Balanço, balanceando deixando que me fira

o balanço desta mágoa, este mar da eterna ira.

Balanço, balanceando contra a outra que sou eu.

domingo, novembro 21, 2010

ALVA VELA

Tenho tudo arrumado no gavetão

do "não quero pensar".

Tenho tudo organizado no eterno chavão;

"O que for se verá".

Hoje acho que consigo tudo e, se tentar,

até consigo antever o que se dirá.

Hoje sou dona do que sinto, porque não sinto.

Apenas calo, apenas guardo, apenas pinto

de cores neutras a minha imensa tela.

Tenho tudo empacotado lá no meu sotão

empoeirado de esquecimento e solidão.

Tenho tudo adormecido, de onde não brotam

imagens, nem sons, memórias ou mágoas,

se eu não pensar e não querer. Se fechar a mão

e nela esconder todas as tarefas árduas

que já vivi e vivo, largando-as na minha alva vela

como uma neutra pintura de uma batalha perdida.


domingo, outubro 17, 2010

VENDAVAL

Pés nus sobre o rochedo
assolado pelos vendavais,
cabelos ao vento no degredo
do silencio agonizante dos mortais.
Eleva-se bem alto a luz do sonho,
como um halo de santa benevolencia,
transfigura-se o sorriso tristonho
em gargalhada de inocencia.

Batida pelos ventos em des-harmonia
rasgada pela espera em lenta agonia.
Sacudida pelo sopro da certeza,
firmando os pés na clareza
do caminho que se abre rectilíneo
traçado pelo esquadro do destino
em passos medidos de declineo,
como se o mundo fizesse o pino
e às avessas corresse a maré-cheia.
E à lua numa dança louca e breve
se juntasse o sol em melopeia,
o meu olhar morrendo ainda se atreve
a cravar bem alto um agudo grito
como se de um pacto ou desvairado rito
dependesse a vida ou negra morte.
De pés nus sobre o rochedo
assolado pelos mais fortes vendavais,
abandonado somente à sua sorte
resiste à noite e ao medo,
resiste à dor e aos silêncios intemporais.


quinta-feira, setembro 23, 2010

PALAVRAS DE LONGAS SOMBRAS


Há palavras que soam como laminas cortantes

e abrem fundos poços de áridos desertos.

Há palavras que soam a ódios gritantes

manchando tudo à sua volta. Deixando incertos

os caminhos, perdidas as memórias,

vãs a dádivas e os sonhos, cada luta,

cada passo; Perdem-se as histórias,

os risos, perdem-se os laços na labuta

por uma insana certeza, uma sombra...

Há palavras que pairam quais rapinas,

gladiadores de encarniçada guerra.

Há palavras duras como o sol nas salinas

de garras afiadas como uma fera.

Há palavras.

segunda-feira, setembro 20, 2010

CINZELADO OUTONO


Olhei o céu de cinzelado tom,

ouvi a chuva que mansa tombava

e deixei meu sonhos à desfilada.

Abri a janela da minh'alma ao som

da outonal chuva que tamborilava

nas minhas vidraças, à desgarrada

com o bater certo do coração errante.

Este eterno sonhador titubeante

que se vai dando em brandos enganos,

em arrobos de instáveis esperanças

e desesperados medos.

A chuva caía lavando os desenganos,

arreigando as certezas mansas,

agrilhoando mais e mais os degredos

da alma que já não acredita mas luta,

por uma qualquer obra do destino, escuta

a voz do coração que ainda bate

ao tom cinzelado do céu outonal.


segunda-feira, setembro 06, 2010

PRATEADO RAIO DE LUAR

Um raio de luz sobre o lago parado,

um feixe prateado de luar

banhando o coração estagnado

cansado de se manter a lutar.


Uma noite de suaves perfumes

e sons de encantado de Verão,

uma ténue luminosidade de vaga-lumes

numa teia dançarina de solidão.

Um raio prateado de dulcíssimo Agosto

num lago de escuras águas pesarosas,

e o majestoso silencio do desgosto

em ondas breves de noites harmoniosas.

Um raio de luz paira sobre o meu lago parado...

terça-feira, agosto 31, 2010

RESUMO DE UMA PALAVRA


Tudo se resume a uma palavra,

a um sentir sem sentimentos,

é como um incêndio que lavra

derrubando em mil tormentos

tudo à sua passagem.

E é nessa dura derrapagem

que as palavras se confundem,

se misturam com a vida.

Pintam a nova roupagem

e quase que nos iludem

mostrando-nos uma saída.

Tudo se resume a uma palavra,

que não tem dono nem norte,

não tem regra e se alarga

como o espectro de uma morte.

segunda-feira, agosto 09, 2010

UM DIA NORMAL


Como qualquer outro dia, levantou-se abriu a janela, deixou que a leve brisa matinal lhe beijasse o rosto e lavasse os restos da noite mal dormida, das dores de cabeça alucinantes que lhe martelavam as têmporas e a preparasse de alguma forma para mais um dia de lutas internas e externas. Como qualquer outro dia engoliu as lágrimas que enevoavam os olhos escuros e olhou para o espaço apertado que a rodeava, ouviu o canto das rolas e o pipilar dos pardais em busca das migalhas lançadas durante a noite, as sobras minúsculas dos jantares e de quem já tomara o pequeno-almoço aquela hora. Como qualquer outro dia o sossego da manhã a invadia com a sua benevolência e paz, que a aconchegavam nos braços e quase a faziam sentir-se feliz. Como qualquer outra manhã afastou-se da janela, arranjou-se, comeu e fez a cama pronta para encarar de novo a vida de sempre.
Fechou a porta atrás de si e compôs o seu sorriso, com a cabeça vazia de pensamentos e o coração despojado de sentimentos, sentia-se um invólucro, uma concha vazia, onde as funções vitais aconteciam por si só. O trânsito, calmo ainda aquela hora matutina, não lhe prendia a atenção e conduzia como se fosse outra pessoa atrás do volante, deu-se conta de repente que deveria estar a prestar atenção ao que fazia, e mesmo com pouco tráfego tinha que estar atenta. Mas a sua cabeça, para além de doer horrivelmente, estava num outro local, num outro tempo, perdida em memórias que queria abafar e esquecer, arrumar de uma vez e não permitir que lhe perturbassem a vida, Normalmente conseguia empurra-las para o mais fundo de si mesma, mas por vezes parecia que tinham vida própria e impunham-se-lhe como se algo de invisível as atirasse de novo para a sua cabeça, faziam-se vividamente presentes, dolorosamente vivas e actuais. Atravessava um desses momentos, e apercebeu-se disso a tempo. Elevou o som do rádio, trauteando a canção que sabia de cor, e olhou pelo retrovisor, seguindo a evolução do carro que a acompanhava havia algum tempo, mas sem prestar muita atenção ao ou aos ocupantes, apenas viu o carro e as linhas elegantes que seguiam na mesma estrada. Um sorriso mais aberto surgiu-lhe no rosto e as ideias começavam a desanuviar um pouco, a dor parecia estar a abrandar e os olhos retomavam a acuidade normal. Mais uma olhadela rápida pelo retrovisor deu-lhe a conhecer que o veículo seguia à mesma velocidade e que não fazia tensão de ultrapassa-la embora não fosse a uma grande velocidade e por norma naquela recta todos se lançassem para embalar para a subida que se seguia. Fixou de novo a estrada deserta à sua frente, olhou para a serra que amava como se fosse um pedaço seu e abriu mais o vidro do seu lado para aspirar o ar ainda fresco da manhã, quase como se esperasse que o odor característico da serra lhe enchesse as narinas. De repente e surgindo do nada uma vontade imensa de ir até à neblina que docemente cobria a encosta força-a a desviar o seu rumo do emprego e dirigir-se para a serra, sem pensar duas vezes, sem hesitar ou sequer se preocupar com o que diria para justificar a falta, algo a empurrava para o seu refugio mais querido, algo a chamava com uma força à qual não conseguia resistir. Metendo pela estrada velha silenciosa e húmida, vai sem destino certo, vai ante saboreando o cheiro, a humidade que lhe arrepia a pele, as gotas de orvalho que lhe escorrem pelos cabelos, ante gozando o prazer que sempre sente naquele ambiente mágico que aprendeu a amar e desfrutar tantos anos antes, quando ainda era uma jovem mulher com sonhos e pensamentos mágicos, onde tudo o que lera sobre religiões antigas, magia e filosofia se misturavam numa girândola de cores e cheiros, de sentimentos e sonhos que a preenchiam e lhe davam sentido para seguir em frente mesmo que a vida fosse um inferno de desespero e vazio. Estranhamente o carro seguia-a ainda.
Longe da vida e apenas absorvida pela estrada sinuosa, pelo silencio cortado pelo roncar breve do motor do seu carro, e pela ânsia de percorrer as artérias de vida da serra, nada a tocava ou a preocupava, não olhou sequer para o espelho nem para as evoluções que o outro carro atrás do seu, desacelerando quando ela o fazia e puxando por ele ao mesmo tempo que ela. O seu coração batia já ao ritmo da seiva que corria nos velhos e escuros troncos, ao ritmo das pedras milenares com as suas histórias escondidas e segredos bem guardados, os seus olhos viam para além da natureza verde e profunda penetrando no âmago das coisas que a rodeavam. Estacionou onde sempre fazia, trancando o carro e levando a mala com o telemóvel no silêncio para que nada perturbasse aquele momento de comunhão e paz, de felicidade quase intocável. Caminhava olhando as copas que em conciliábulo murmuravam entre si, pisava a musgo e as folhas mortas que aos poucos se transformavam em rico húmus, aos seus olhos a floresta, as pequenas flores silvestres, as gotas de nevoeiro, tinham o brilho, o encanto a magia que sempre lhes conhecera, envolviam-na nos seus braços amorosos e doces como sempre haviam feito, a paz que costumava invadi-la quando ao lado de alguém trilhara pelas primeiras vezes aqueles mesmos caminhos, voltava a preenche-la. Agora de uma forma estranha e diferente, como se um vazio, mas um vazio sem dor, doce, terno, meigo e aconchegante, a envolvesse, a transportasse para um novo horizonte, uma nova perspectiva. Ao seu lado estavam os misteriosos duendes e fadas, todos os pequeninos seres, invisíveis para os olhos e almas que não se deixam levar pela magia, a saudavam como alguém muito amado. O seu coração extravasa e as lágrimas correm pelos olhos, a alma purifica-se naquelas lágrimas, sente-se leve, quase a flutuar…
Uma mão prende o seu braço trazendo-a rápida e brutalmente à terra, olha como que perdida, estremecendo como se um raio a tivesse atingido, como se um cubo de gelo lhe trespasse o coração, os olhos quase loucos e sem verem tentam desesperadamente ver quem a prende. Aos poucos vai acalmando a acelerada frequência cardíaca, a respiração torna-se mais lenta e consegue ouvir através do nevoeiro mental que lhe embota a consciência e os sentidos. A mão que repousa no seu braço húmido de orvalho fá-la despertar do sonho e encarar a realidade; Estranhando o caminho que levava e que a desviara do emprego, resolvera segui-la, encontrando-a naquele estado de semi transe. Sem saber bem o que fazer, o seu chefe resolve fazer-se notado tocando-lhe no braço.

domingo, agosto 08, 2010

ONDE FICA A VIDA?


Como gotas de nevoeiro liquido

os sonhos desfazem-se ao toque.

Onde ficam a verdade e a mentira?

Onde ficam o amor e o ódio?

Como gotas de salgado mar

que no furacão da vida encontra um rochedo

e se desfazem em branda maresia.

Onde ficam os sonhos e os desejos?

Onde ficam as angustias e as certezas?

Como lágrimas de um olhar sem futuro

que a vida derrubou por acaso.

Onde fica a alegria do amor?

Onde fica a dor de um adeus?

Como gotas de neblina matinal

que os anjos depositaram na terra.

Onde fica o esquecimento?

segunda-feira, julho 26, 2010

APETECE-ME ANDAR DEVAGAR


Apetece-me andar devagar,

sem pressa, sem meta, somente andar

ao ritmo do calor que impera,

que amolece e desespera.

Apetece-me andar devagar

ao ondular lento das searas,

ao ritmo dolente das cigarras

e tão somente vaguear,

entre as espigas prenhes e claras

que me prendem como amarras,

sem contudo me embaraçar.

Apetece-me andar devagar,

sem pensar na vida e na dor,

como a borboleta poisar

em cada pequena flor,

sorver o néctar e voar

lentamente sem prisões,

sem memórias, sem sentidos.

Apetece-me andar devagar,

esquecer as desilusões

das promessas e desmentidos,

ser folha perdida no vento

somente deixar-me vogar

nas ondas do pensamento

longe deste lugar.

Apetece-me andar devagar....

terça-feira, julho 20, 2010

QUANTO CUSTA A FELICIDADE?

Quanto custa a felicidade?

Um oceano de sacrifícios, um mar de amarguras,


um abismo de força, um trilho de agruras.


Quanto custa a felicidade?


Ver o coração partir-se, ver partir quem se ama,


dizer adeus a um sonho, deixar morrer uma chama.


Quanto custa a felicidade?


Lutar por uma quimera, acreditar no impossível,


empenhar toda uma vida como se fosse plausível.


Quanto custa a felicidade?


Uma vida.


Um caminho.


Um sonho.


Um coração…


Tudo.

segunda-feira, julho 12, 2010

SOMENTE HUMANA...


Somente humana, somente mulher!

não me peçam impossíveis,

não me peçam a perfeição,

sou somente humana, somente mulher.

Não me tornem invisíveis

os sentimentos em turbilhão,

sou somente humana, somente mulher.

Não sei amordaçar o coração,

não sei ter força desalmada,

sou somente humana, somente mulher.

Não sei não ceder e manter um não,

sou frágil na caminhada,

tropeço no meu próprio andar,

somente porque não sei não amar...

Sou unicamente humana, tão somente mulher.

quinta-feira, julho 08, 2010

SOMENTE A NÉVOA


Névoa envolvente e húmida,

baixando lenta e silenciosa

cobrindo a vida putrida

numa onda odorosa.

Névoa amiga e poderosa,

que descendo breve na calma

aparente dos meus dias,

te revelas esplendorosa

nessa branca luz sem alma,

com a qual me desafias

a abrir de novo os olhos,

encarar de novo o caminho

a abraçar novos escolhos.

Colher de cada raminho

num novo alento, uma vida.

Névoa húmida e envolvente,

esconde-me...Docemente.

terça-feira, junho 15, 2010

SEM MÁGOAS, SEM PENAS


Dobrei os restos, as sobras,

arrumei-os no esquecimento.

Alisei da vida todas as dobras,

dos sonhos, de cada momento.

Enterrei todas as lágrimas

e apaguei a chama ardente,

depus o escudo e a esgrima

fechei a porta, tranquei o batente.

Dobrei tudo o que sobrou

sem mágoas e sem pensamentos,

e deste espaço que ficou

quero fazer novos momentos.

Do vazio que não destrói

quero que permaneça apenas

esta calma que não dói

esta dor que não tem penas.

sexta-feira, junho 11, 2010

SOMBRAS DO MEU CAMINHO...


Acordam as doces sombras do caminho

que trilho em passos lentos sem fim,

nos ramos das árvores em cada ninho

aconchega-se a vida sem mim.

Nas veredas desta oca vida

que passo a passo se percorre,

entre lágrimas e sorrisos dividida,

o coração lentamente cala-se e morre.

Doce morrer entre o arvoredo,

entre as sombras das veredas!

Doce olhar à volta, e sem medo

partir suavemente envolta em sedas,

em carmim e verde água,

entre azuis e lilazes de saudade.

Alma que deslizas sem a mágoa

que um dia te feriu sem piedade.

Acordam as doces sombras do meu caminho...

terça-feira, junho 01, 2010

SOMENTE O SOL....

O Sol brilha no céu azul e sereno,

a brisa de um verão anunciado

sopra ao de leve os meus sonhos,

o coração finalmente em paz, repousa.

O Sol bem alto, quente e pleno,

irradia calor e um ambiente desusado

que afasta o bizarro e enfadonho,

enchendo-me da calma de quem ousa

caminhar pela vereda silenciosa,

umbrosa, verde e majestosa.


O Sol brilha com fulgores de verão,

a terra ri sob os seus raios dourados,

eu caminho a trilho solitário

de quem achou finalmente a sua rota.

Calmo, manso, cadenciado bate o coração,

longe dos sonhos loucos e ansiados,

os passos seguem ao contrário

daquela vida que eu fiz digna de nota.

Mas o Sol continua a brilhar alto no céu

e eu a trilhar a vereda de sombra...

sexta-feira, maio 07, 2010

SOB A VENTANIA


Alma nua de ventania,

verde e roxa de maresia.

Alma louca de solidão

nas dobras da desilusão.

Mãos sem dono e sem rumo,

mãos desfeitas em fumo,

debatendo-se na imensidão

dos dias feitos de nada.

Alma nua na vastidão,

de desertos adornada,

de sonhos despovoada

de negro amordaçada.

Alma nua na ventania

da voragem da vida,

vestida de melancolia,

espartilhada e dividida.

sábado, abril 24, 2010

ANIVERSÁRIO


A neblina matinal cheira a musgo,

cheira a pinheiro e alfazema,

à tímida violeta. À caruma molhada.

Hoje a rima fugiu sem destino

mergulhou no silencio duro e doce

que envolve a memória e a dor.

Que envolve a saudade e o sorriso amargo.

Escondida entre os pinheiros sábios

está a alma, o coração, o sentimento,

está um sopro de vida.

E a neblina cheira a vida, a musgo

verde, a terra túrgida e perene.

Em conciliábulo de deuses passam as horas

mortas; Vivas de memórias e sonhos

de desejos e lágrimas.

Hoje a neblina tem um cheiro profundo,

um lágrima no rosto, um nome nos lábios

e uma dor de saudade cravada no coração...

A neblina cheira a musgo verde de saudade.

sexta-feira, março 26, 2010

MAIS UM DIA...


Um dia, outro dia, mais um dia.
Outro dia que passa na voracidade das horas
mal contadas, mal vividas, esquecidas
e longas.

Um dia, outro dia , mais um dia.
Onde as partidas se fazem sem demoras
e a nostalgia se agarra às vozes ressequidas
de desesperadas delongas.

Mais um dia, outro dia e outro dia,
nesta louca e rubra nostalgia
de ver passar somente os dias
em memórias de uma vida fugidia.

segunda-feira, março 08, 2010

IRONIA

Como a onda que intrépida se atira contra as rochas em dias de tempestade, como o vai e vem insano da força do mar.

Como as longas cabeleira de espuma e os lívidos olhos do oceano, como o desesperado escachoar do mar revolto.







Como as gotas de angelical orvalho no vidro, como as lágrimas de uma
qualquer dor de alma.

Como os sonhos desfeitos na falésia da vida e afundados nas profundas
águas encrespadas.






Como a dança louca das tresloucadas palmeiras, abanando sob a impiedosa mão do vento, como a ironia de um destino sem rumo dançando sob a mão do vendaval.

Como o abandono grisalho de uma vida às mãos duras do temporal, como o rodopiar da desconsertada melodia.





Como qualquer réstia de esperança vã caindo de um céu em turbilhão,
como os "dedos de Deus" por entre as nuvens na imensidão do espaço nu.
Como a força com que o naufrago se agarra à vida, como o sonho preso por uma qualquer teia de aranha solitária.


Assim passam os dias de irónica fantasia.

domingo, fevereiro 28, 2010

NATUREZA


A natureza recolheu-se nas profundezas

de cada ser, fechou os olhos cansados,

poisou as mãos tristes e guardou as asprezas

dos dias vãos, desiludidos e esgotados,

num rito de agonia silenciosa e fria.

O céu encobriu-se, como que por magia,

e a chuva ondulante, crepitante e pura

caiu...Caiu...Caiu...Noite e dia, noite e dia.

A natureza chora na melancolia dura

de um rosto sem tempo de cor sombria

e olhos cegos de solidão.

Onde está a tua mão?

Onde está o teu olhar, o teu rosto?

Onde estás para que a natureza viva?

quando voltas a acender o teu gosto,

a deixar que a esperança reviva?

A natureza permanece muda, calada

sem cor e sem animo. Resguardada

numa redoma de vidro fosco, encerrada

em cada ser distante e alheado.

A natureza está tolhida e amarrada

a um cais velho e amargurado.

Quando voltas para soltar amarras?

sábado, fevereiro 20, 2010

RASGANDO A ARIDEZ


Mãos abertas, mãos estendidas,

mãos indefesas e desertas

como o olhar perdido na imensidão

do mar em ondas rendidas,

em luas rasgadas e incertas.

Mãos desejosas sofrendo na solidão

do abraço que tarda, do beijo sonhado,

eternamente adiado.

Mãos que se fecham, mãos que choram

como órfãos no desconsolo da noite,

no desvario do escuro e duro vazio.

Mãos que se abrem e imploram

o toque breve, afago que se afoite

a quebrar as amarras e este frio

que se instala de manso e tudo consome;

O calor, o amor, a vida...tudo se some

nas mãos vazias, duras e frias,

somente abertas.

sábado, fevereiro 06, 2010

UMA FORMA...SOMENTE

Não ter peso, não ter limites,

não ter fronteiras nem barreiras,

ser uma forma, somente uma forma,

vogar no espaço amplo e aberto.

Esquecer o "posso?" e o "permites?"

Ser como as nuvens passageiras,

ser só uma forma, sem que a norma

seja a humana, seja este imenso deserto

em que enterro os pés doridos.

Os sentimentos calados, sofridos.

Não ter peso, não ter fronteiras,

não ser um Ser pensante e vivente,

apenas forma ao sabor do vento,

farrapos de chuvas tão ligeiras,

farrapos de um sonho ainda punjente

ecoando manso como um lamento.

segunda-feira, fevereiro 01, 2010

ETERNIDADE NUM MOMENTO...


A eternidade num momento,

um momento de eternidade.

Dar importância a como se vive

e não ao que se vive.

Saber guardar o triste lamento

num breve olhar de claridade,

sabendo que o que já tive

só porque quero, sobrevive.

Saber olhar a vida nos olhos

e os olhos da vida saber olhar,

perceber que apesar dos escolhos

talvez ainda valha a pena lutar.

Erguer de novo o cansaço

de inglórios passos vividos,

esquecer este oco espaço

e todos os momentos sofridos.

A eternidade num momento,

ou um momento de eternidade?

domingo, janeiro 24, 2010

IMAGEM NO ESPELHO


A imagem que o espelho reflectia era a de um rosto mais velho. A pele, que jamais fora brilhante e bonita, agora tinha a marca que os anos iam impondo aos poucos, a flacidez ia tomando lugar, e as rugas, ainda finas mas já visíveis, iam deixando pinceladas de vida passada e vivida.
Nunca gostara de espelhos, durante toda a sua vida olhava para eles apenas para ver o conjunto de si mesma se lhe agradava ou se tinha que mudar algo, mas nunca dedicava atenção à sua imagem reflectida naqueles pedaços de vidro espelhado, parecia-lhe pura perda de tempo estar em contemplação e admiração de si mesma, o espelho era para ver como estava o todo, nada mais.
Mas agora olhava com mais atenção aquele rosto que lhe devolvia o olhar e o meio sorriso, olhava e via a percurso dos anos. Não que a assustasse, ou que a deixasse triste ver que envelhecia. De todo! Apenas lamentava o tempo que desperdiçara, a estrada que percorrera não fora a melhor, mas...Provavelmente também não fora a pior, fora a que tivera que ser, a que fora "superiormente" decidida, se é que assim podia pensar e dizer. Enquanto escovava o cabelo já com algumas cãs, das quais gostava bastante e exibia sem medo, ia observando a expressão do seu rosto; As faces descaiam já um pouco, as rugas de expressão nos cantos dos lábios eram mais notórias agora, e as finas linhas nos cantos dos olhos também, os lábios continuavam os mesmos, carnudos sem ser em exagero e descaídos nos cantos, o que lhe dava um sorriso quase sempre triste excepto quando abria o riso e aí sim, era menina de novo, as suas gargalhadas continuavam bem dispostas e alegres como sempre. O pescoço afinara e também já se notava alguma pele sob o queixo. Estava a ficar velha!
Mas gostava no geral do que via, só lá bem no fundo do olhar que o espelho devolvia se notava a tristeza do que perdera, do que não vivera, do que não fizera, de todas as sementes que não plantara à beira do seu caminho, e dessas outras que haviam dado flores e que por isto ou aquilo haviam secado no Estio da vida, ou no Inverno da morte. Deixava que a memória a atraiçoasse e a levasse de regresso ao passado, ao seu passado; - Revia os amores infelizes, jamais conseguira ser verdadeiramente feliz no amor. Tivera bons momentos, mas fugazes e breves, nada que guardasse ainda a seu lado, tudo lhe escorrera entre os dedos como água de um ribeiro que jamais pára, jamais se detém e sempre flui. Revia as amizades grandes e duradouras, belas e fortes como o amor nunca fora, e aí sim o espelho devolvia-lhe um sorriso aberto de boas lembranças e momentos alegres e felizes. Revia a família, aquela família que ela tanto amara de menina e que depois de adulta a desiludira tanto e tão profundamente, quantas lágrimas não haviam caído daqueles olhos escuros que no espelho se enchiam de novo da névoa húmida que sempre os povoava mal se lembrava de certos episódios mais marcantes. E o tempo ia recuando sem piedade, mostrando a vida que levara, a estrada já percorrida e que se afigurava como uma dessas rectas intermináveis em planuras Alentejanas em plena Estiagem; Uma longa fita de alcatrão negro apenas, pisado, marcado pelo rodado dos automóveis que vão e vêem, vão e vêem incessantemente, sem mais cuidados, apenas passam na voracidade do tempo e na urgência das horas e das distancias.


Era tempo de parar o devaneio. O cabelo estava penteado, o espelho mostrava-lhe uma mulher madura, sobriamente arranjada mas com gosto e descrição como sempre fora. O conjunto parecia-lhe bem!
Apagando a luz da casa de banho, encostou a porta deixando lá dentro o reflexo de um sorriso eternamente triste, e uns olhos povoados de lágrimas, mas a mulher que pisou a rua ia de novo segura, madura e serenamente confiante, a sua máscara diária que raramente a traía.

O TEMPO PERDIDO NÃO SE RECUPERA

As palavras lançadas não voltam atrás, o tempo perdido já não tem retorno e a vida esvai-se, no silêncio voraz. Fica o caminho, diluído, sem...